Minha história, seu
moço, é muito triste!
Quem lhe fala é um
menino abandonado.
Eu nasci de um estupro
desgraçado...
Desde ai, só tristeza em
mim persiste.
Minha mãe já morreu, não
mais existe,
E só ela me amou como eu
a amei,
Um momento feliz, nunca
passei,
Pois a rua me fez um
rato humano.
Vou vivendo num mundo
desumano,
E até quando, seu moço,
“inda” não sei.
No momento em que minha
mãe morreu,
O que já era ruim ficou
pior.
Eu passei a viver do meu
suor;
Das malícias que Deus do
céu me deu...
Mas depois o que foi que
aconteceu?
Dessa parte eu nem gosto
de falar...
Ninguém mais me chamou
pra trabalhar
E eu passei a ter fome a
vida inteira.
“Nesse instante eu
troquei a mamadeira
Por um tubo de cola pra
cheirar.”
Me condenam, me vendo
cheirar cola,
Dizem logo que eu sou um
traficante,
Sou bandido, que eu sou
um mal constante,
Que eu devia ser morto
na degola.
Mas por que não me botam
numa escola?
Por que não me dão
chance de viver?
Cheiro sim! Mas cheiro
pra não morrer,
Tu não “sabe” o que é
fome, que tu “come”,
Pois quem tem o que
comer não sente fome,
Sente apenas vontade de
comer.
Outro dia, eu passando
na calçada,
Escutei numa casa, na
TV...
Um tal de um presidente
prometer
Ajudar a criança
abandonada.
Nem sabia quem era o
camarada,
Mas meu peito tomou-se
de esperança...
E apostei toda a minha
confiança
No que aquele infeliz me
prometeu,
Mas na certa, seu moço,
ele esqueceu.
Nessa história, sempre
sou eu quem dança.
No que diz esse povo do
poder?
Esse povo não sabe o que
é sofrer,
Nenhum deles se Põe no
meu lugar!
Só que agora o que eu
vou lhe revelar
Talvez deixe você
titubeando:
Fome ou frio nada são se
comparando
A essa dor que me dói
feito facada,
Que é ver gente mudando
de calçada
Quando notam que estou
me aproximando.
Sou mais um maltrapilho
desgraçado
Aumentando a fileira da
pobreza.
Meu viver não possui a
sutileza
Do viver de um menino
bem criado.
Sou apenas um rato
camuflado,
Sou alguém sem futuro e
sem destino,
Sou cigano da vida e
peregrino
Das estradas que a fome
produziu,
Sou produto fiel “Made
in Brazil”,
Disfarçado no corpo de
um menino.